Con(sumo)






Consumimos além da conta, renda, ou juízo. Roupas desnecessárias, carros que só faltam andar em cima d’agua, eletrônicos dos mais diversos tipos, cremes em quantidade tal que hidratariam a pele dos habitantes de um estado. Bebemos aquela água suja do capitalismo com nome de droga. Nossos sorrisos reluzentes e petrificados nas colunas sociais, álbuns de formatura e eventos festivos remetem aqueles do creme-dental, fotografias que um dia nos farão lembrar do quanto fingimos bem a felicidade.


Você é um idiota completo se não tiver o tênis dos campeões e acessórios inúteis com estampa oncinha que custaram mais do que a renda mensal de algumas famílias. Falando nisso, nossos parentes não são famílias se não comerem a margarina lá no café-da-manha, hoje livre de gordura trans para não infartamos do miocárdio, mesmo que o peito continue sufocando. Nossas necessidades desnecessárias se criam conforme a tecnologia evolui, nossas ações dependem da oferta, quem financia é o ecossistema que acreditamos ter de prover nossa estupidez como um seio inesgotável.

Nossas crianças colecionam prateleiras de brinquedos improfícuos e adulterdos, nossos jovens entopem-se de objetos e narcóticos, nossos adultos adquirem tudo aquilo que a alma não consegue comprar. Tem que ter, as revistas ordenam. Vai ficar de fora? Já disse “alô” hoje pra quem você ama? Só é possível pelo celular. Aliás, compre um daqueles que manda fotos para que seu amado se lembre da sua fisionomia. E não esqueça o sorriso escovado, tão reluzente quanto aquele espelho novo, que poderia estar pendurado na altura da cintura, visto que não se enxerga nada além do próprio umbigo.

Consumimos veículos que não nos levam a lugar algum, roupas que nos enfeiam porque alguma bicha louca ditou que é bacana, eletrônicos que nos robotizam e separam cada vez mais, cama sem aconchego, mesa sem afeto, banho sem tranqüilidade. Nossas belas casas estão longe de se tornarem lares. Nossos animais de raça, pet-shopados, escovados, perfumados e de unhas feitas fazem parte de nosso visual ultra-fashion. Medimos as possibilidades de uma pessoa pelo quanto ela pode pagar.

Casamos por dinheiro. Levantamos da cama por dinheiro. Trazemos gente ao mundo por dinheiro. Temos coragem de dizer que temos medo da violência e dos marginais, sem cogitar a assustadora violência que é se empurrar alguém para fora da margem social. Seguimos brincando de invisível quando algum pirralho sujo e morto de fome vem bater na porta do nosso vidro na sinaleira, ou parodiando de heróis achando que fizemos a boa ação do dia ao puxarmos 2 pilas do bolso.

Compramos presentes no dia das mães, pais, crianças, e aniversários, cujos preços delimitam o calibre da afabilidade e dos votos. Transformamos carboidratos em afeto, e entupimos nosso corpo com as mais diversas porcarias para desviarmos dessa nossa verdadeira imundice interna. Consumimos uns aos outros e a nós mesmos, amores descartáveis, sexo seguro sem o menor risco de afetividade, e voltamos pra casa cada vez mais abarrotados por fora e esvaziados por dentro. Con... sumimos...

Um comentário:


  1. Lá eu estava na festa de minha namorada em um clube noturno de dois andares. Fui até o primeiro para pegar uma cerveja, eis q avisto Regina com um casal de amigos. Fluxo sanguineo aumenta e pupilas dilatam. Começamos a conversar, mas logo avisa que estão indo para outra festa. Neste momento sinto uma força oculta me levando em direção ao trio que vai em direção a saída. Peço que me esperem um pouco, enquanto ligo para minha namorada. Ela não atende, e no lugar dela um senhor com sotaque espanhol responde. Pergunto se ela está aflita pela minha demora no que ele responde que não, parece normal. O remorso me toma conta ao passo que cedo ao impulso de seguir o trio pela saída. Porém, assim que chego a rua vejo que não me esperaram. Tudo está meio distorcido, e como tomei poucas cervejas, das duas uma: ou fui drogado sorrateiramente ou estou sonhando. Vou vagando pelas ruas, quase sou atropelado, até que chego à minha antiga casa. Vejo que ela está toda reformada e que virou casa noturna também. Vou entrando como se dono fosse, passo pela sala, olhando de relance as poucas pessoas que ali estão. Mas ao subir as escadas uma delas me chama a atenção, e tenho que voltar para conferir. Entro em choque ao ver Regina novamente. O choque é suficiente para me fazer acordar.

    Argh...03:40h da madruga. E ao passo que minha mente ainda se adapta da viagem de volta do mundo de Morpheus, ela tenta dar um significado a mais este sonho maluco.

    Eis que entram em campo Razão e Emoção.
    ...
    Emo: Ei cara estou te dizendo, ela é a escolhida.
    Raz: Ih, la vem você de novo com esse papo. Pra que arriscar algo garantido por algo incerto?
    Emo: Algo incerto do tipo um amor com compatibilidade musical, intelectual e espiritual?
    Raz: Ah não dá pra discutir com você, sempre com essa melação de sentimentos. Seguinte, segundo o histórico, a estatística aponta para um probabilidade de 84% de frustração e sofrimento.
    Emo: números, números....Isso não é algo mensurável seu gênio!
    Raz: Mais um argumento a meu favor. Na falta de dados não podemos tomar uma decisão no escuro.

    Percebendo que perderia mais uma vez essa discussão, a Emoção tenta uma nova abordagem...

    Emo: Ok, então consulte o histórico. Veja quantas vezes Regina apareceu em nossa vida.

    Nesse momento surgem imagens como a da garotinha esperando seus pais no portão da escola, jogando sinuca na faculdade, na ban...

    Raz: Ok, ela aparece diversas vezes mas isso pode ser apenas coincidência.
    Emo: Ta, e como você me explica uma garota maravilhosa com todas suas qualidades que ela tem ainda estar solteira?
    Raz: hmmm....

    Raz: Ok você venceu...não sei como responder esta pergunta.
    Emo: Eu sei....maktub

    E na sua primeira vitória a Emoção decide mandar esta mensagem engarrafada, para acabar de uma vez por todas com esse buraco na alma. Seja preenchendo-o com amor ou cauterizando para que pare de sangrar...

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