Sim, vai contar
E diz assim
Que eu chorei
Que eu tranquei
Que eu sufoquei
Que eu acordei
Que eu pus fim
Mas passei da hora

Sim, pode rir
E que teus dentes afiados
Rasguem mais do que me resta
Que a tua verdade tão rasa
Afogue o que em mim
Ainda crê

Sim, vai contar
E conta vantagem
Fala do quanto ofuscou
Aquilo que fez iluminar
Do teu em talento em conseguir
Me deixar te ansiar

Sim, pode falar
Da tua habilidade
De em mim conseguir plantar
E deixar morrer de sede
Conta para os amigos do efeito
Os meus me avisaram da causa

Sim, vai espalhar
Que eu ensurdeço, e me cego
Por querer, e por tudo querer
Que são essas as melhores
De fazer o que brilha apagar

Põem meu nome na lista
Para exibir pelas ruas
A minha parte nua e crua
E culpada como réu
O que mostro sem desdouro
Leva mais este troféu

Mas lembra-te que um dia
Que não tarda por chegar
Há de olhares para cima
A imensidão admirar
Ao perceber que teve um dia
Uma chance de voar

Olharás para este espaço
Sem mais ter como voltar
Lembrarás do que nasceu
Do que (quase) foi só teu
E assassinou no meu olhar

(Mas por hora... vai contar)

Louco é quem tenta ser normal



Em homenagem ao movimento anti-manicomial


ATO I

- Nem adianta eu começar que tu não vai entender.

- Não vou entender o que?

-Eu sei o que tu pensa. Tu, e os outros médicos também.

- Que bom, quem sabe tu podes me ensinar como fazer isso. Porque eu não sei como se descobre o que os outros pensam. E vou precisar da tua ajuda para saber o que tu pensas.

- Tu achas que eu sou louco. Tu, e todo mundo. Ninguém entende. Quantas vezes vou ter que repetir isso, porra? Fica aí achando que eu sou louco mesmo, e tudo certo.

- Se tu tens isso como verdade, o que vier a partir disso é lucro.

- Tu é bem engraçadinha, né. Não adianta, ninguém entende.

- E tu? Tu mesmo, entendes?

- Eu sinto. Não sei se entendo.

- Se sentes, será que podes me ajudar então?

- Tu que tem que me ajudar, tu quem faz isso aqui, tu que estuda pra isso.

- Sozinha, não faço nada. Não aprendi na escola a fazer mágicas.

Para, olha em surpresa. Sorri pela primeira vez. Cessa a guerra verbal.


ATO II

Recomeça a guerra verbal.

- Tu até que sabe fingir bem que entende certas coisas.

- Tu também até que sabe fingir bem que me deixa entender certas coisas.

Ele ri.

- Tu curte me acertar em cheio, né?

- Tu “curte” transformar tudo em um duelo, né?

- Touché.


ATO III

Silêncio, mas com certa inquietação corporal, mover de mãos. Fita o aquário, parece se distrair ao observá-lo, e penso que já o perdi novamente. E lá permanece por 20 minutos. Deixo que se vá. Mas ele volta. Olha com firmeza, e me diz com consistência na voz:

- “ Imagina um peixe!”

(Pausa, respira mais fundo)

- Um peixe, que tem toda imensidão do oceano a seu dispor. Que pode, se quiser, ir lá no fundo do oceano, onde o homem nem suporta fisicamente, e mesmo que suportasse, ele se aterrorizaria”.

No momento que o peixe morde uma isca qualquer, que lhe cruze o caminho. Ele o faz, não porque ele quer abrir mão do oceano. Louco ele seria se quisesse abrir mão do oceano.”

Ele o faz porque pensa que tem alimento ali, dando sopa, ele é enganado, mas só cai porque ele quer viver. E em troca da vontade dele de viver, ele ganha a morte. É o risco. Se ele parar pra cada comida que surgir, e pensar, ‘nem vou morder, vai que tenha um anzol por trás’ ele morre de qualquer jeito. Mas daí ele morre por medo de morder anzóis, e não por querer viver”.

- Muito bem, estamos conversando agora. E quanto aos peixes ali, no aquário?

- Esses aí coitados, nem sabem que existe oceano. Nasceram ali, e acham que essa é a realidade. Tem a limitação das paredes de vidro, servem de entretenimento pros olhares curiosos. Mas também, recebem comida segura, e constante. São peixes-enfeite, não seres-vivos.

ATO IV

- “Quero te perguntar uma coisa. Será que, quando eu estiver fora da água, né? Será que tu vai me colocar num aquário, ou tu vai me lançar de volta pro mar?”

- “Tu quem vais escolher para onde ir. O que posso fazer é te ajudar a refletir sobre essa escolha, e continuar aqui, independentemente dela”.


ATO V

- “Talvez respirar o ar não pese tanto como eu achava. Mas estou começando a pensar que fora da água, talvez eu não morra assim, tão rápido. O que também não me tira o oceano.”.

(...)


" The lunatic is on the grass

The lunatic is on the grass

remembering games and daisy chains and laughs

got to keep the loonies on the path

The lunatic is in the hall

the lunatics are in the hall

the paper holds their folded faces to the floor

and every day the paper boy brings more

And if the dam breaks open many years too soon

and if there is no room upon the hill

and if your head explodes with dark forebodings too

I'll see you on the dark side of the moon

The lunatic is in my head

The lunatic is in my head

you raise the blade,

you make the change

you rearrange me ' till I'm sane

you lock the door

and throw away the key

there's someone in my head but it's not me

And if the cloud bursts, thunder in your ear

you shout and no one seems to hear

and if the band you're in starts playing different tunes

I'll see you on the dark side of the moon

And all that you touch

and all that you see

all that you taste, all you feel

and all that you love

and all that you hate

all you distrust, all you save

and all that you give

and all that you deal

and all that you buy, beg, borrow or steal

and all you create and all you destroy

and all that you do

and all that you say

and all that you eat

and everyone you meet

and all that you slight and everyone you fight

and all that is now and all that is gone

and all that's to come

and everything under the sun

is in tune but the sun is eclipsed by the moon "

OBS: Agradecimentos ao meu amigo Rodrigo, que num gesto de extremo cavalheirismo criou um blog para descobrir como se colocava videos em blogs, e ensinar a tapada aqui.

Onde mora minha (insustentável) saudade



Do latim solidate, que significa “solidão com influência na saúde” , o dicionário define a saudade como a “ lembrança nostálgica e, ao mesmo tempo, suave, de pessoas ou coisas distantes ou extintas, acompanhado do desejo de tornar a vê-las ou possuí-las; nostalgia. Pesar da ausência de alguém que nos é querido.

Bom, né? Mas no dicionário também tem referências a uma planta da família das dipsacáceas e asclepiadáceas, o que não vem ao caso neste texto.

Salvo minha amiga Julia, que tem saudade do gosto da coca-cola de garrafinha de vidro, a grande maioria das pessoas sente saudade daqueles momentos e daquelas pessoas que nos marcaram a vida seja lá como for, ou “ daquela infância querida, que os anos não trazem mais”, como dizia o poeta.

Esta é uma espécie irredutível de saudade que se carrega ao longo da vida, e que bom mesmo, afinal deve ser muito triste andar por ai esvaziado, ou ter vivido tão em branco o ponto de não ter do que sentir saudade.

Embora nostálgica, este tipo de saudade nós não apenas carregamos conosco, mas já se torna parte de quem somos, ou seja, é uma saudade constituinte. Está arraigada e fixada tão densamente, que se torna uma tatuagem (em alma) que a gente não tem mais como tirar fora.
A gente a observa em flashes cruzados quando fecha os olhos, quando se está sozinho, quando se está vivendo um momento difícil que parece que não tem mais fim, e suspira em grito silencioso, trancado no pensamento: “ai, que saudade daquele tempo (pessoa, situação, ...).”

Na verdade este tipo de saudade é uma obra (por vezes de arte, por vezes medíocre, mas sempre uma obra). Funciona como um cinema mudo, onde somos os criadores. E tem a extraordinária capacidade de embaçar as fotos, de colorir os filmes, de restaurar aquele quadro tomado pelo tempo.

Os bastidores, a lente que quebra, a imagem tremida, o erro de script, a atuação vaga, o roteiro ruim, a tinta que escapou do contorno, o final decepcionante... nada disso entra nesta saudade. Ela é uma obra cujos contornos foram adornados de forma tão irretocável, que nada mais nos resta do que cair na melancolia de querer se voltar ao próprio quadro, e dar-lhe vida.

Sim, porque quadros nunca tiveram vida, eles são expressões da própria vida. Um recorte de vida imortalizado. Assim como isso do que tanto sentimos falta, talvez de fato, nunca tenhamos vivido, tal como repintamos em nossa mente. O que não significa que ela não doa, ela dói. E parece ser uma dor de falta, mas só parece.
Dói porque sabemos que nunca teremos de volta aquilo que nem arriscamos pensar que nós nunca tivemos, pelo menos, não da maneira como nos “lembramos” que tivemos. E como esta lá, no passado, e não morre nunca, dói mais ainda, pela incapacidade de consumação.

Mas tem uma outra face da saudade. Uma que não nos constitui, como a saudade nostálgica, mas que talvez seja uma falta, de verdade. Uma saudade insustentável.

Para mim, a saudade mais cortante
Mais inadmissível
É aquela de tudo o que ainda não vivi
Porque eu não vivo de passado
E nem mesmo no futuro, porque quero o hoje
Mas a minha saudade mora lá...
no horizonte

Me falta...




Mesmo que distante
Conheço-te assim tão perto
Que se pudesse moldar o ar
Te esculpiria em vento
Para que ainda mais perto
De mim pudesses chegar

Nessa minha terra florescida
Que me brota em prosperar
Ao regares com teus olhos
Nesse solo fez lugar

E na incerteza oscilatória
Por marés onde navegar
Honraria a liberdade
Em tuas ondas traria porto e cais

E naquilo que te ardes
Sou artífice em deslizar
Pois aquilo que me brasa
Ambiciono incendiar

E mesmo quando em alma
Para em Éter respirar
Além deles e como eles
Fogo, água, terra e ar
Todos estes tenho em sobra
E se pulverizam em desejar
Querer a ti como o elemento
Que me corrói por faltar

Na espera não se alcança



Na espera, não se lança
Só se lança na ação
Mesmo a flecha atirada ao horizonte
Há de chegar no encontro com o chão

Na espera não se anda
É a imobilidade em questão
É permanecer inerte a outrem
Ou qualquer outra situação

Na espera não se alcança
Estacado no relógio que passa
Extraindo em cada segundo suado
Mais um pouco daquilo que anseia

Na espera não se resolve
O que se quer, ou o que não
Uma vez que se torna da espera
Sua própria condição

Na espera quando imposta
Nada há de criação
Desrespeita o tempo próprio
Despedaça o coração

Então, por que ainda espero?
Sem mais porque de ilusão
Me pergunto e não respondo
Pois não vivo com razão

Mariana


Dizem alguns psicanalistas, estudiosos do assunto, que o primogênito é um eterno filho único, frustrado em não ter sido suficiente ao ponto de preservar sua unicidade. Que jamais recupera-se do “trauma”, e procura o resto da vida ser único e melhor em tudo, numa tentativa em restaurar essa suposta falta que ele pensa que teve.


Os caras estudam, e teorizam sobre isso, mas não sei... trauminhas latentes a parte, eu detestaria ter sido filha única.


Sem ninguém para poder dividir os anos constituintes do meu eu, quem iria me lembrar de mim mesma quando a vida me força a esquecer?


Sem ninguém para compartilhar os castigos, brigas bobas (e sérias), disputas de espaço, quem iria fazer vez da minha própria diferenciação e noção de individualidade?


Sem ninguém para chorar abraçada no chão, ou dar gargalhada de madrugada, quem iria me trazer essa humanidade e noção de pertencimento?


Sem uma taurina teimosa e centrada para me dizer que estou viajando, e me mandar voltar da lua, quem iria me ensinar que sagitarianos erram nas flechas, mesmo se achando bons arqueiros?


Sem aquele sorriso que me alivia o espírito, pra me dizer que tudo bem, que perdoa meus egoísmos, minhas vaidades, e meus todos 7 pecados capitais?


Sem alguém para me dar a mão, e o braço, e o ombro, e o colo, e o coração, quando me falta ao próprio corpo?


Sem minha pequena, para que eu me ache grande?


Ou sem minha grande, quando eu me sentir pequena?


Não posso te cumprir aquela função de irmã mais velha, de servir de exemplo, e de abrir-te caminhos. Este peso do exemplo, definitivamente, eu abdiquei desde que descobri que era gente, e que melhor seria errar e fazer, do que levar a vida em branco. Buenas, o que não fazer tu já sabe, então. E quanto aos caminhos, também não posso abri-los para ti, porque sigo tentando me achar na própria estrada. Mas posso te acompanhar no teu, e no meu tu sabes que tem lugar reservado.

Essa é a função fraterna. Somos pai e mãe, somos meninas e adultas, somos fortes frente as nossas fragilidades, temos o mesmo sangue correndo nas veias e nossa alma tem o mesmo DNA, somos parecidas em nossas completas diferenças, completamo-nos como a bailarina não pode dançar sem a musica, somos enlaçadas pela vida e para a vida. Somos irmãs.


E por isso, e muito mais que isso, saldo esse dia. E saldo a própria vida, ao me presentear contigo, naquele 14 de maio de 1986.

Qualquer outra coisa


...

Se não fosse para ouvir que tudo bem
Que mesmo te esqueceu de esquecer
Que outro alguém conseguiu entrar e ficar
Que mais nada de mim resta nos teus passos
Que teu violão já compõem outras canções

Queria calar os amigos quando de ti trazem notícias
Queria nem saber se por mim perguntas, ou lamentas
Que não te trai e nem lutas contra a lagrima em seco
Que não sorri quando relembra minhas trapalhadas
Que em nada comove recordar meus pesares

Que não mais lhe importa a minha impulsividade
Se eu continuo pensando que o sol inveja a lua
Se eu sigo fumando para suspirar, se consigo dormir ou comer
Se continuo me achando tão forte como queria
Se estou conseguindo domar meus excessos
Se o mundo nas costas tem me pesado

Ou qualquer outra coisa, que não um vácuo na sombra
No lugar no lençol, no olhar perdido pela janela do carro
Um silencio vazio, uma tela em branco e sem invenção
Queria ter comigo levado para bem longe e esvaziado
O dia que os olhos se cruzaram e se demoraram
Nossos sorrisos, nossas musicas que honravam as manhãs
Nossas juras entrelaçadas pelas chuvas

Cada segundo, dia ou hora, queria extinguir
E o sangue que jorra da tua alma queria estancar
Teria carregado em mim apenas
Teus braços e enlaces na minha oscilação
Teu emudecer em minhas tempestades
Teu calor em meus tempos de inverno
Que os quadros pudesse embaçar antes de secos

Teria ainda levado embora comigo também
Aquelas caricias de eternidade
As preces, e pecados em cumplicidade
Teu zelo a minha vida antes mesmo da própria
Minha arte de guerra em meio a tua destruição
A biografia reescrita em tom de poesia

Queria para sempre poder apagar
Tua ambição de em mim nova vida gerar
E de mim nunca ter que voltar
O canto no ouvido ao sonho embalar
Teu peito batendo com o meu e dentro do olhar
Meu jeito insano e urgente de amar

E assim, como deve ser, para sempre, enquanto
Para que esse amor louco e santo pudesse enfim
Morrer em paz


(...)

- O que a gente faz quando a gente erra?

- Primeiro admite, pra si mesmo. Depois pede perdão, para quem envolvemos neste erro.

- Se não tem perdão?

- De que tipo de erro estamos falando aqui?

- Daquele tipo de erro em que tu podes dividir os momentos entre antes e depois dele.

- Erro grave, erro mesmo.

- Sim.

- Bom... Se não tem perdão, a gente deve tentar consertar.

- Se não tem conserto?

- Bom, se tu me diz que não tem conserto... É porque certamente tu já percorrestes um longo caminho, desde que admitiu o erro, até me fazer esta pergunta.

- Sim.

- E te garantiu que isto que dizes é fato? Que realmente não tem conserto? Tentou de verdade conserta-lo?

- Eu tentei.

- Tentou, ou tentou te desculpar?

- Tentei consertar... tentei pedir desculpas...
O que tu estas me perguntando, de verdade?

- Te pergunto, na verdade, se tu permaneces no erro. Porque às vezes, o conserto significa simplesmente parar de errar.

- Ainda não consegui elevar-me ao ponto de conseguir parar de errar.

- Mas veja bem. Eu falo aqui deste erro especifico. Não da condição intrínseca ao fato de se ser humano, e consequentemente errar.

- Sim, eu entendi. E respondi.

- Então, tu não percorrestes todos os caminhos. Tu podes ter reconhecido, e tentando remendar, renomear, ou sei lá que caminhos podes ter escolhido. Mas tudo a partir de. Como tu mesma disse, um erro em que divide os tempos entre antes e depois. Tu percorrestes apenas o depois.

- Mas e se eu não tenho mais acesso ao antes?

- Vai ser a conseqüência do teu erro. Mas vai ter que de alguma forma, se realmente estiver disposta a consertar, a andar por lá.

- Sim, mas vou voltar pra lá sozinha.

- Sim, assim como saiu de lá sozinha.

- Mas nunca mais vai ser igual.

- Mais uma vez, conseqüência do teu erro.

- Então não tem conserto, porra!

- Conserto sempre tem. O que pode é não ter perdão.

- E o que eu faço se quero consertar, e quero muito ter perdão?

- Conserta, que vais chegar no perdão. Nem que seja no teu próprio.

(...)

Desterritorialização (de volta pra nada)


Que lar é este ao qual eu quero voltar?
Se apagou-se o caminho de volta
Se a rua mudou de nome
E os números embaçaram
Se os trinques foram trocados

Onde foi que eu morei por tanto tempo?
Que não consigo localizar o endereço
Que não lembro do bairro, cidade ou país

No desamparo do menino que me conta
Que não tem casa onde ficar
No pai que nem totem recebeu em seu fim
Na mãe que não o reconhece quando vê
Quando a árvore carregada de folhas ancestrais
Apodrece nas raízes


E o que morreu quando nasceu?
Qual foi o ventre que gerou a extinção?
Na fragilidade da menina que me diz
Que a pele, só a pele que lhe resta
No irmão que leva o sangue quando vai

Quando ruína, onde se ergue?
E o que resta nos destroços?
Alem de poeira cinza e sujeira
Resto de argamassa de construção
E espírito sem chão

Sem terra para sustentar
Sem teto para resguardar
Sem paredes para conter
Levando só o coração na mão

Foi lá que fui morar
(...)



Eu sou aquela...



Falando um pouquinho de mim, para que eu mesma me lembre quando esquecer. Convido (e desafio) todo mundo a tentar faze-lo, mesmo que nunca seja a totalidade, e nem teria como ser.

(OBS- Fazer de si mesmo, ne?)










Entre aquelas, eu sou aquela...
Que racionaliza tudo, mas que (quase) nunca age com razão.
Que as vezes se corta e se deixa cortar, para lembrar que tem sangue correndo pelas veias.
Que espera, mas nunca sentada.
Que suporta a loucura alheia, mas nem sempre a própria.
Que se passa um pouco, e sempre para mais.
Que ri de si mesma, mas toma cuidado quando ri dos outros.
E falando em rir, que ri da própria desgraça, porque tem coisas que só rindo mesmo.
Que ouve o que não se diz em palavras, mas as vezes se desliga quando os outros estão falando (comigo, o que é pior).

Que sabe que coração é relíquia, e toma cuidado com isso.
Que escreve poesia de madrugada (e às vezes recita versos de madrugada pro dia nascer feliz, mas aí já são outros 500).
Que tem vontade de colocar os amigos no colo, e coloca.
Que exagera, e não sabe viver de outro jeito (mas exageeeeeeeeeeeera mesmo).
Que tem memória fotográfica, mas que esquece as datas importantes (ai!).
Que dá a vida pelos seus, mas que não se arrisca por qualquer bobagem.
Que teima em ficar pulando sem medir a altura do tombo.
Que quando cai geralmente se esborracha. Mas que quando levanta... tem vontade de gritar : “Ahhhhhh, isso é o melhor que pode fazer? Manda mais”. (Mas não grito, vai que Deus escuta).
.
Que pode prestar atenção em um detalhe imperceptível da vida em pleno trânsito, mas as vezes freia em cima da faixa porque não viu o sinal vermelho (cuidado, nem sempre dá tempo de frear).
Que não tem TPM, e nem acredita que ela existe, e acha que é uma bela desculpa feminina (vou apanhar!!!).
Que tem um buraco gigantesco na alma que ninguém pode fechar (mas que as vezes gostaria que alguém conseguisse)
Que não se toca nem um pouco ouvindo um drama-vitimizado, mas se comove quando vê alguém tentando ser engraçado para tapar a dor.

Que detesta ir ao salão de beleza, mas que é vaidosa ao ponto de as vezes querer beijar o espelho (não sei se deveria publicar isso, que coisa mais absurda de se admitir).
Que erra pra caramba, mas sabe como se pede desculpas.
Que chora ouvindo musica.
Que escreve cartas que nunca entregou (e nunca vai entregar).
Que tem muita sorte na vida, mas não fica se fiando muito nisso.

Que não repara no novo corte de cabelo das amigas, mas que se for indagada a dar palpite, não sabe dizer que ficou bom se não achou (ui).
Que geralmente acha graça onde não tem, mas não se priva de um choro bem chorado.
Que tem vergonha de cantar para poucas pessoas, mas que se sente em casa num palco.
Que as vezes queria ser homem, só pra poder dizer “tu deixa de viadagem, e vamos ir tomar uma ceva”.
Que tem saudades, mas tenta se convencer que é “melhor do que caminhar vazio”.
Que sabe que não sabe tanto e que tem muito que aprender, mas acha que já sabe um pouquinho.
Que queria pintar tudo o que vê e parece que ninguém percebeu.
Que liga pra dizer que ama, e que fala que tem saudade quando tem.
Que mesmo entendendo que em certos momentos o melhor é omitir a verdade, mente mal pra caramba, e acaba falando .

Que deixou de ser ingênua há alguns tombos atrás, mas que vai ser romântica até morrer, não tem jeito.
Que viaja sem sair do lugar, e quando vai pra longe que vê o quanto esta perto.
Que quer ter filhos, mas que não sabe se é sensato trazer mais gente para esse mundo cão.
Que corre porque não se conforma de não ter nascido com asas.
Que tem sintomas concomitantes, mas queria (muito, muito) ser normal.
Que faz planos e sonha, mas que sabe que só existe o presente (de fato).
Que tenta se organizar dentro do próprio caos, mas que acha caótica a forma de “organização” do planeta.

Que tem uma dificuldade tremenda em se desligar, sem que seja se desligar completamente(estou vencendo isso).
Que as vezes se acha muito indispensável, mas que já aprendeu que não é tão irresistível assim.
Que tem que estar constantemente se provando pois se tem como maior adversária, e dificilmente se perdoa por errar.

Que fica maníaca jogando, mas até tenta repetir que “perder faz parte do jogo” .
Que no meio da confusão consegue encontrar tranqüilidade, mas que na tranqüilidade tem sempre uma inquietação (maldita).
Que “adora um amor inventado”, mas sabe construir relações sólidas.
Que se acha boa psicóloga, mas péssima paciente (embora siga firme na analise).
Que tem medo de ter medo, e as vezes, de não ter.

Que tem fobia a aglomerados humanos, mas dependendo da situação passa por cima disso (shows principalmente, mas adoraria poder assistir privê).
Que tem amigos tão maravilhosos, que se questiona as vezes se consegue fazer jus a eles.
Que não tem religião, mas que as vezes reza sei lá para quem estiver ouvindo (e agradece também).
Que ama animais e natureza, mas que gostaria de exterminar todas as baratas do planeta, pois acha que elas são ET’s sem a menor utilidade na cadeia alimentar.

Que é usualmente incompreendida, mas que aprendeu que não pode se esperar que os outros compreendam o que nem a gente mesmo entende em si (oh Lord...).
Que não é nenhuma metamorfose ambulante, mas que muda de idéia no meio do caminho (e volta, se necessário).
Que quer estar lá para quem precisa, mas que acha difícil pedir socorro.
Que lê sobre tudo, mas desanima se alguém puxa um assunto chato pra parecer cult.

Que as vezes acha que o dia deveria ter 48 horas, e quando tem tempo de sobra não consegue fazer nada que tinha que fazer.
Que não se impressiona nem um pouco quando a tentam impressionar, e sim quando se esta pouco se lixando pro que os outros vão pensar.
Que tem uma vontade latente de quebrar as regras, mas que nunca trai as suas próprias leis.
Que nas férias tem saudade da vida útil, e na correria sonha com o ócio (quem não tem isso hein?).

Que é do tipo geração saúde, e fuma (e gosta... e bebe, e adora um boteco, afff).
Que quando ama, ama tanto que não cabe em si, ao ponto de se deixar expandir pelo próprio amor.
Que sabe cuidar de quem gosta, mas que tem certa dificuldade em se deixar cuidar.
Que tem o coração quebrado, mas que aprendeu a fazer mosaicos com os pedacinhos.
Que adora a liberdade, mas que finca raízes.
Que perdoa, sempre que pode e que o perdão for sincero, mas acha que tem coisas que não tem perdão.
Que se atrapalha, mas acha que tem uma loucura sã .
E que tem um tesão louco pela vida. Mas as vezes cansa, e quer desaparecer da face da terra sem deixar rastro.

E chega, já me comprometi demais. Viu como sempre me passo?

CREPÚSCULO SAGITÁRIO



( e um pedido de desculpas na justificação)










...



....





Tem fases em que meu nome muda para “sumida”, e as pessoas assim me batizam. Deixo de me chamar Manuela, e passo a ser “aquela que some”.

- “Tu sumiu!”
- “Sumida!”
- “Por que tu somes assim?”

São frases que eu escuto por ai. Sim, eu tenho uma patológica falta de permanência, que vem e vai. Mas isto não significa que eu esteja pouco me lixando para os meus. E nem que eu esteja fugindo de alguma coisa, eu não fujo. Alias, encaro bem quando tenho de fazê-lo. Porem existe intrínseco ao meu eu mais primitivo, uma necessidade imensa de solidão. No presente momento estou vivendo a proximidade, e por isso posso até escrever sobre, e tentar me desculpar um pouco.

Tenho também a sorte de ter alguns poucos e bons amigos tão especiais, que me observam partir sem ter planos, e me permitem voltar quando quero. E gostam de mim, apesar disso. Sim, porque esta necessidade é minha, e eu sou egoísta o suficiente para atende-la. Ai eu fico inacessível, em plena era da comunicação. Mas eu também sei o quanto nos tornamos eternamente responsáveis por aquilo e aqueles que cultivamos, então também rego e acarinho as flores do meu jardim.

Um dos melhores elogios que recebi, foi de uma grande amiga, que me disse que consegue me ter presente na minha necessidade de ausência, porque quando me faço presente, sou tão inteira que consigo preencher estes espaços, e espaços futuros que ela sabe que virão. Olha a minha sorte de ter amigos assim!

Mas nem sempre as coisas são assim compreendidas. Tem muitos que ficam chateados, que se emburrecem, que de fato se magoam, que acham que eu não tenho interesse nas amizades, e as vezes nem me querem mais de volta, porque me exigem que eu jure que não vou sair, e eu não juro o que não posso (nem o que posso). Eles tem urgência, e não conseguem entender que eu simplesmente sumo, mas que eu também sei voltar. E sei pedir desculpas. E sei recompensar.

Mas eu preciso do crepúsculo, de introspecção, de encontrar a melhor forma de expressão à mim mesma. Porque o mundo é célere, de uma loucura apressada que a gente se “acostuma” e faz de conta que é normal, que nos obriga a jogar o jogo, e tem que aprender mesmo a jogar o jogo para sobreviver. Mas chega uma hora, em prol da minha própria sanidade, que eu me tranco no camarim onde estão todos os personagens que já me vi representando, e todos os papéis pelos quais aspiro ansiosamente.

Preciso me lembrar de quem é o ator, fora de cena. Em síntese, preciso reafirmar meu pacto comigo mesma, de ser o que sou, independente do que o mundo lá fora espera ou não que eu seja. De descobrir quem eu ainda nem sei que sou. E de cogitar o que eu gostaria de ser, ou me tornar.

Eu sumo quando eu sangro. Porque o corte é meu, e eu que tenho que fechar. Eu sumo quando eu não sei mais o que fazer. Porque a duvida é minha, e eu que tenho que descobrir. Eu sumo quando me falta tranqüilidade, porque o barulho esta na minha mente, e não na melodia da vida. Eu sumo quando me escuto e não me ouço. Eu sumo quando eu tenho fome e não sei de que. Eu sumo quando eu pareço estar enxergando na neblina. Eu sumo quando eu não quero me deixar anestesiar, mesmo que assim doa mais.

Eu sumo quando tenho medo de ficar só, porque descobri que a maior solidão é querer se encontrar nos olhos dos outros. E porque eu tenho medo de ter medo.

Eu sumo porque eu preciso sumir. E para conseguir estar (e ficar) de verdade.