Do que não tem fim(e suas doses diárias)*


Sentes como é frio?
Minguado do tempo
O imorredouro dia de adeus
A hora

Sentes o toque sereno?
O afago imperceptível
Como o da pele deslizando sobre o mar,
com seus lábios e espuma?

Afogas no desespero, meu anjo,
acorda que já é saudade.
Ainda está quente.

Meus olhos correm para o teu peito desordeiro
E fogem para além das tuas luas e catástrofes
Pois meus passos já buscam o compasso
dos meus próprios passos

Passo inevitavelmente a me reencontrar
Na dissoluta força do teu abraço
Enquanto teus braços dissolvem o ritmo do tempo

Os ecos dos teus soluços disfarçados
Ressoam como brisas
Viram vendaval
Derrubam tuas estrelas como beijos cadentes
E escorrem salgados
Nas sedas dos suspiros e mágoa,
manchadas com o vermelho do teu sangue

O inferno foi reservado para o artista
que de tão vivo padece
Nos abismos desenhados das cidades
Dentro e fora das grades
Pois há celas até para os santos
Enquanto anjos despencam de prédios
Para ganhar asas
Para ganhar asas
Para ganhar asas

O asfalto ainda é quente
O sangue ainda é quente
Os braços correm para as valas
Pois a vontade ainda é quente

Mas acabou
O corpo é frio


*Escrito em 2001, quando eu era adolescente.