Reminiscências

Não existe um único dia que eu não lembre. São coisas tão estupidamente simples, desconexas, como cheiro de chá de erva-doce, uma curva acentuada, o nascer do sol, uma maldita e minúscula flor na grama que ninguém mais parece reparar. Ando me sentindo uma caçadora de lembranças. Todos os dias cavo um pouco mais fundo, numa ânsia de encontrar algumas que possam ter se escondido, encobertado, quiçá camuflado.
   As que possuo estão se esgotando, não dão conta de matar a saudade crescente de ti, fortalecida e nutrida pela imposição da tua ausência. Encontrar lembranças foi a forma que encontrei de te ter e te levar comigo, veja só. Sei que de nada adianta, mas queria que soubesses que cada passo que dou, cada som que escuto, cada minúcia que percebo, sabor que sinto, grito que contenho, choro que tranco, emoção que broto, vem impregnados de um pedaço teu.
   Não quero que entenda mal. Eu consigo lidar com a tua falta. Não me impede de sorrir, de enxergar o mundo em seus detalhes, de viver como se deve. A saudade em si é um desconforto que eu gosto de carregar, o que seria de mim ter vivido tão em branco sem ter do que sentir saudade? Dói, mas não me mata, embora também não fortaleça. O que mata não é tua ausência da minha vida. É a tua ausência. É te olhar nos olhos e procurar qualquer rastro teu que seja e não encontrar. É ver um sorriso tão endurecido que remete a um choro cristalizado. É me perder no vácuo que faz teu silêncio asilado nessa fala compulsiva. O que mata mesmo é constatar o teu abandono de ti mesmo.

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