Caminho das Pedras



Sob a enorme pedra da palavra que encera um assunto, existe uma pluralidade de vocábulos, discursos, expressões, verbos, sujeitos e predicados esmagados. O diálogo empedrado referente consiste em: “Oi, tudo bem, o que andas fazendo?”. Geralmente é seguido por: “Oi, tudo e contigo? Ah, o de sempre, estudando, trabalhando”.

A pedra se chama cordialidade posterior. Ao que? Varia bastante. Não pretendo responder, então petrifico assim. Levantando-a porém, encontrarias a seguinte resposta:

Como tudo pode estar bem do jeito que as coisas estão? E mesmo que assim não estivessem, ainda teria fome no mundo. Então não está tudo bem, nem jamais estará, pelo menos no prazo que se estende do meu nascimento a minha morte, depois não sei.


Ando fazendo uma porção de coisas. Continuo pensando em ti todos os dias. Sinto tua falta um tanto. Reencontrei-te por um triz para desencontrar tão depressa, que tempo anti-horário foi esse? As vezes te procuro na memória, porque tem traços bem singelos do teu rosto que a ausência já me anda embaçando. Sabe como diz a música, “o esforço pra lembrar é a vontade de esquecer”.


Continuo fumando meus cigarros de cereja eventualmente, tentando comer bem regularmente, treinado assiduamente, lendo compulsivamente, arriscando inconsequentemente, sentindo exageradamente e trancando o choro que toda noite vem me visitar em forma de insônia.


Sigo tentando me convencer que o não teve inicio nem fim simplesmente não existiu, e sou tão quase boa na argumentação quanto na arte da negação. Permaneço inconformada com o esvaziamento da nossa geração, temendo muito me perder a ponto de me acostumar.


Continuo cantando todo dia, independente do meu humor, o que varia é letra de canção, O violão que sabe. Sigo escrevendo e estudando todos os dias. Tenho pintado e desenhado bem menos do que gostaria, inspiração nunca falta, o que falta é calma. E gosto de ter, para tal. De onde ela vem mesmo? Sim, voltei a escutar Los Hermanos infatigavelmente.


Ando com medo de uma porção de coisas. De ser cais que nunca recebe a chegada. De ser navio que nunca encontra o porto. Ou de continuar sendo oceano, que tanto abriga, mas tanto revolta. De ser “estanque, como quem constrói pontes e não anda”. A juventude passa tão rápido, e desde muito cedo sinto o desgosto de vê-la arrancada de mim. Nos últimos dias anda me assombrando ainda mais.


Minha alma continua tão ou mais inquieta como da última vez que nos vimos, minha mente idem. Meu coração anda aprendendo sobre reciclagem e desenvolvimento sustentável, mas continua com déficit de atenção. Sigo em forte crise existencial e minha intimidade casual com a filosofia tem piorado bastante o quadro.


Continuo lutando contra mim. E por vezes me vejo correndo atrás da cenoura, feito o burro de carga. Continuo levando tristeza nos olhos, aperto no peito, e por vezes me sinto insustentavelmente leve de tão pesada. Tão inundada que emudeço. Mas bem sei que o que fala meu silêncio é língua morta, quase ninguém traduz. Talvez ninguém mais além de ti.

Pactuemos então, e deixemos as pedras quietinhas. Tudo bem?

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