Efeito Borboleta



O texto a seguir é do meu querido amigo Francis Londero, figurinha repetida aqui nesse álbum eternamente incompleto. Além de psicólogo, mestrando, astrólogo, poeta, inteligente, e possuidor de um sarcasmo singular que só cabe a sua pessoa, o cara ainda arrasa quando escreve. Segue o feito:

Ontem à noite, ao me deparar com a profunda vontade de fazer nada, acabei por ligar a tv. Deparei-me com um filme do qual já ouvira falar milhares de vezes. Ouvi gente relacionando-o com a física quântica e sua famosa frase de que “uma borboleta batendo as asas no Japão mexeria com a força das ondas no mar latino americano”. Se não é bem assim a frase, é quase isso...

A película retrata em grande parte o desejo de todos, de poder voltar ao passado na tentativa de garantir um presente perfeito, mais sereno, tranqüilo e feliz. Quem nunca se imaginou voltando ao passado e fazendo sua vida de outra maneira? O que é perturbador neste filme é que o destino do garoto muda sim, mas não da forma que ele tinha planejado. O caos sempre joga junto com o sujeito os dados do destino: efeito borboleta!

A grande sacada que podemos tirar do filme pode ser assimilada a partir do conceito nietzscheano de amor fati - amor ao destino. Não importa como as coisas procederam na vida a partir das ações tomadas, mas sim na maneira em que se aceita “pelear” nos acontecimentos efetivados em vida. No querer o seu destino sempre e de maneira infinita. No perpassar pelas mesmíssimas coisas infinitamente para sempre.

Ora, com um desejo assim, como alguém iria se dar ao luxo de “errar” em suas escolhas de vida? É somente desejando de maneira infinita o próprio destino que o criamos originalmente. Amamos o destino e neste caso já não se tem certo ou errado em tal percurso, já não é importante o que se efetivou enquanto vida, mas sim a intensidade de vida que se colocou em tais avanços. Vida criativa do amor fati...

A questão é: somos capazes de desejar com tanto desprendimento a vida, não se importando mais para o que deu certo ou errado? Imagino que não, ao menos, na grande maioria do tempo. Afinal, podemos ver o quanto tentamos nas possibilidades de fuga do destino que já se realizou. Reféns de um passado lamentado, sussurros que enraízam o sujeito na tristeza errada que se transformou o presente.

O interessante nesta história toda, é que no mundo contemporâneo, além de cairmos em crises de lamúrias por um passado perdido, ainda temos de maneira mais discernida a ciência de que o passado retocado, mudado e transformado no que seria ideal não dá garantia nenhuma de felicidade e de certeza de que nada dará errado.

O mundo contemporâneo se caracteriza por uma verdade que desliza, que nunca é encontrada e concretizada. A partir de seu modos de subjetivação, dilui-se o mundo romântico de final feliz, de verdades e certezas. E nesta diluição das verdades, do enfraquecimento e mesmo da diminuição de uma identidade no sujeito contemporâneo, vemos o mesmo dançando entre seus fracassos na medida em que, ou fica a lamuriar seu presente insatisfatório fruto das ações passadas, ou se vê desamparado na impossibilidade de produzir seu futuro, devido à potência que o plano de virtualidades lhe oferece.

Ora, não se tendo mais instituições “fortes” que lhe digam o caminho “certo”, o homem contemporâneo se encontra perdido para tomar para si tamanha liberdade. O que fazer então com os efeitos produzidos por anos de domesticação que despotencializaram o sujeito, enquanto ser liberto? O que fazer para que as escolhas feitas não se tornem um fardo quando o mesmo olhar para elas no passado?

A questão é saber se o efeito borboleta que desejamos transcorre a partir da produção de desvios no que já se passou, ou se ele se passa na criação de desvios a partir dos processos de atualizações do mundo virtual, do mundo em potencial que está aí para se realizar. No caso do primeiro, olhar para trás na tentativa de apagar pegadas mal feitas. No segundo caso, a afirmação das pegadas que se vai marcando na estrada da vida.

Um comentário:

  1. Faz tempo deste texto... por aqui comecei a me arriscar nos tais dos blogs.... bjs manuelita!

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